
A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) realizou nesta quarta-feira (22/10) o leilão de cinco blocos de exploração no polígono do pré-sal durante a sessão pública do 3º Ciclo da Oferta Permanente de Partilha de Produção (OPP). O evento ocorreu apenas um dia após o Ibama liberar a perfuração de poços na Foz do Amazonas, decisão que contraria recomendações de ambientalistas e comunidades locais.
As Ofertas Permanentes de Partilha (OPPs) são o mecanismo por meio do qual o governo disponibiliza blocos exploratórios no polígono do pré-sal — onde estão as maiores reservas conhecidas de petróleo do país —, além de outras áreas consideradas estratégicas pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE). Nesta rodada, o quantitativo de blocos no regime de partilha foi ampliado, passando de 10 para 15 áreas, o que aumenta a superfície total de exploração para 24,8 mil quilômetros quadrados.
Das cinco empresas vencedoras, quatro são estrangeiras e apenas uma é nacional. O leilão arrecadou R$ 103 milhões em bônus de assinatura e prevê R$ 451 milhões em investimentos. A Karoon (Austrália) venceu o Campo Esmeralda, na Bacia de Santos; a CNOOC e a Sinopec (China) arremataram o Campo Ametista, também na Bacia de Santos; a Petrobras conquistou o Campo Citrino, na Bacia de Campos; a Equinor (Noruega) levou o Campo Itaimbezinho, na mesma bacia; e o consórcio Petrobras + Equinor ficou com o Campo Jaspe, também na Bacia de Campos.
Enquanto a sessão ocorria no Rio de Janeiro, sindicatos, movimentos sociais e organizações ambientais protestavam em frente à sede da ANP. O ato foi organizado pelo Instituto Internacional Arayara, pela Federação Nacional dos Petroleiros (FNP), e por sindicatos como o Sindipetro Rio de Janeiro, Sindipetro Amazonas, Sindipetro Sergipe/Alagoas e Sindipetro Litoral Paulista. As entidades denunciaram que o novo ciclo de leilões entrega áreas estratégicas a grandes petroleiras internacionais, contrariando o discurso de soberania energética do governo federal.
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O diretor da Federação Nacional dos Petroleiros (FNP), Leandro Lenfredi, afirmou que a crescente presença de capital estrangeiro no setor ameaça tanto o meio ambiente quanto a autonomia nacional. "Estamos aqui para nos opor aos leilões de petróleo, que reforçam a dependência externa e o desrespeito ao meio ambiente e aos trabalhadores. O Brasil já produz mais de cinco milhões de barris por dia, metade é exportada, e seguimos contribuindo para o aquecimento global em troca de dividendos a acionistas estrangeiros".
Lenfredi defendeu uma transição energética justa e popular, com geração de empregos e controle público sobre as riquezas naturais. "Cada novo poço é mais carbono e mais lucro para poucos. Precisamos colocar a capacidade dos petroleiros e ambientalistas a serviço de um projeto de sociedade que priorize o povo e o planeta".
O diretor técnico do Instituto Arayara, Juliano Bueno, doutor em Riscos e Emergências Ambientais e conselheiro do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), reforçou que a política atual de exploração não está alinhada a uma transição energética justa. "O debate sobre o futuro energético do país deve incluir, em primeiro lugar, a proteção e valorização dos trabalhadores, como os afetados pelo fechamento da Refinaria Refit. A verdadeira transição deve ser socialmente inclusiva, ambientalmente responsável e economicamente justa".
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Em nota técnica intitulada “Pré-sal e Expansão Fóssil: Implicações Sociais, Econômicas e Ambientais”, a Arayara alerta que as emissões do setor de petróleo e gás quase dobraram em 15 anos — de 0,36 GtCO2 em 2010 para 0,66 GtCO2 em 2024. A nota também enfatiza que a arrecadação de royalties do pré-sal não se converte em melhoria de indicadores sociais, citando como exemplo municípios como Macaé (RJ) e cidades produtoras do Rio Grande do Norte, que continuam vulneráveis às oscilações do mercado e às desigualdades socioambientais.
Entre as recomendações apresentadas pela Arayara, estão o fim imediato dos leilões de petróleo e gás, a moratória sobre novas fronteiras exploratórias, a reestatização da Petrobras e a priorização de investimentos em energias renováveis e soberania energética. Para a entidade, a continuidade da política de expansão fóssil coloca o Brasil em rota contrária à descarbonização e à justiça climática.
