
Oito organizações ligadas aos movimentos ambientalista, indígena, quilombola e de pescadores artesanais ingressaram na quarta-feira (22/10) com uma ação na Justiça Federal do Pará contra o Ibama, a Petrobras e a União. O grupo pede a anulação do licenciamento ambiental que autorizou a estatal a perfurar o Bloco FZA-M-59, na bacia da Foz do Amazonas. A licença foi concedida pelo órgão ambiental no último dia 20, após quatro anos de impasse e pressão política.
A ação foi protocolada na 9ª Vara Federal de Belém por entidades como a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), a Comissão Nacional para o Fortalecimento das Reservas Extrativistas (Confrem), além do Greenpeace Brasil, Instituto Arayara, Observatório do Clima e WWF-Brasil. As organizações pedem liminar para suspender imediatamente as atividades de perfuração, alegando risco de danos ambientais irreversíveis.
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Segundo a ação, o licenciamento apresenta três irregularidades principais. A primeira é a ausência de consulta livre, prévia e informada às comunidades indígenas e quilombolas da região, conforme prevê a Convenção 169 da OIT. Também não foram realizados estudos específicos sobre os impactos do empreendimento nesses povos.
O segundo ponto questiona falhas técnicas no modelo de dispersão de óleo apresentado pela Petrobras. As entidades afirmam que os dados utilizados são de 2013 e não consideram as particularidades da região, como correntes subsuperficiais e a presença de sedimentos na coluna d’água. Essa defasagem, segundo a petição, compromete a segurança da operação e pode atingir o Grande Sistema Recifal Amazônico, considerado um dos ecossistemas mais ricos e sensíveis do planeta.
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O terceiro argumento aponta que o licenciamento desconsiderou os impactos climáticos da exploração petrolífera, em desacordo com os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil no Acordo de Paris. As organizações destacam que a autorização contraria alertas da Agência Internacional de Energia, que desde 2021 recomenda o fim de novos projetos de combustíveis fósseis para limitar o aquecimento global a 1,5°C.
Para Kleber Karipuna, coordenador-executivo da Apib, o projeto “ignora a voz dos povos indígenas, verdadeiros guardiões da floresta, e escancara as contradições do governo ao investir em combustíveis fósseis às vésperas da COP30”. Já Núbia Cristina, coordenadora da Conaq, classificou a decisão do Ibama como “atrocidade”, “a gente vem aqui repudiar a ação que o governo brasileiro fez, sem consulta prévia, livre e informada para a população quilombola”.
Entidades ambientalistas também criticaram o governo por autorizar a exploração em um momento em que o país tenta se posicionar como liderança climática. “É inaceitável que um projeto dessa magnitude avance sem consulta às comunidades afetadas. Isso é uma afronta à Constituição e à Convenção 169 da OIT”, afirmou Nicole Oliveira, diretora do Instituto Arayara.
Angela Barbarulo, gerente jurídica do Greenpeace Brasil, lembrou que a licença “foi concedida sem estudos que identifiquem e mitiguem adequadamente os riscos e impactos socioambientais”. Já Suely Araújo, do Observatório do Clima, apontou que a decisão “lança as bases para a ocupação petroleira da região amazônica, em plena crise climática”.
O bloco FZA-M-59, onde a Petrobras já iniciou a perfuração do poço Morpho, é o primeiro de uma série de novos blocos em licenciamento na região. Ao todo, outros oito aguardam análise e 19 foram arrematados em leilão da ANP em junho deste ano.
O Correio entrou em contato com o Ministério de Minas e Energia, mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem. O espaço segue aberto.

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