
Por Theófilo Aquino* e Mariana Carvalho** — O Tribunal de Contas da União (TCU) recebeu, recentemente, a proposta de solução consensual relativa ao contrato de concessão da Ferrovia Transnordestina Logística S.A. (FTL). O requerimento apresentado pelo diretor-geral da ANTT é notável pela sua transparência e sinceridade. Aponta que a remodelação contratual pretendida implica risco moral em relação às demais concessionárias diante da possibilidade de firmar acordos superiores com o Poder Público em relação aos atuais contratos de concessão. Também indica riscos relativos à devolução de trechos e valor de indenização, nível de detalhe dos estudos e da proposta de otimização operacional da FTL, valores de tarifas e receitas acessórias, ausência de cronograma de investimentos a curto prazo e necessidade de modernização contratual.
A concessão possui histórico de inadimplemento contratual e baixa capacidade de investimento, tendo sido objeto de recomendação de caducidade pela ANTT ainda em 2019, apesar de essa medida ter sido afastada pelo então Ministério da Infraestrutura. Não à toa, vem sendo acompanhada de perto pelo TCU, existindo, inclusive, determinação vigente no Acórdão 467/2024-PL, que impede a efetivação da devolução de trechos pela FTL sem que se "conclua o encontro de contas destinado à apuração e restituição aos cofres credores dos eventuais prejuízos causado pela TLSA e FTL".
Ainda assim, a ANTT e o Ministério dos Transportes afirmam que o encontro de contas perdeu seu objeto, haja vista a possibilidade de solução consensual, insistindo na via de "otimização contratual", em que pesem riscos severos de toda a natureza que a própria agência faz questão de reconhecer.
No caso em questão, não nos parece que haja qualquer conflito passível de mediação pela SecexConsenso. Afinal, há uma concessionária que não demonstra capacidade de investir conforme o contrato e apresenta recorrentes inadimplementos. Cenário agravado pela própria fragilidade demonstrada na justificativa de viabilização de novos investimentos.
O único conflito aparente se dá entre os interesses da concessionária e a mais do que razoável decisão do Regulador pela inviabilidade da prorrogação do contrato e pelo dever de ressarcimento de todos os prejuízos causados. Por que então o Regulador se furta a decidir?
O requerimento do diretor-geral da ANTT dá importantes indícios dos reais motivos. Destaca ali "o risco de responsabilização de gestores em razão de atos praticados no exercício de suas atribuições funcionais, instaurados no âmbito do TCU em decorrência de decisões tomadas no campo da gestão contratual". Também sinaliza a essencialidade da participação do Ministério para contribuir com "considerações relevantes acerca da política pública em andamento hoje para o ativo concedido e para o setor como um todo."
Se, além de ter que enfrentar a insatisfação da concessionária, a ANTT ainda tiver que lidar com o risco de sanção aos seus servidores e possíveis atritos institucionais com o Ministério, nada mais compreensível do que procurar desde o início o Tribunal para poupar tempo e recursos.
Doutor em direito e desenvolvimento. Membro da Comissão de direito portuário, marítimo e aduaneiro da OAB-SP. Advogado sênior no Piquet, Magaldi e Guedes Advogados*
Membro da Comissão de Advocacia perante Órgãos de Controle da OAB-DF. Advogada associada ao Piquet, Magaldi e Guedes Advogados**
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