
Por Maria Luisa Nogueira Pimentel* — O Projeto de Lei 4/2025, apresentado ao Senado em 31 de janeiro de 2025, propõe alterações significativas no Código Civil. Entre os principais pontos está o fortalecimento da autonomia dos condomínios, com atualizações sobre a aplicação de multas por inadimplência, a possibilidade de exclusão de condôminos com condutas antissociais e a restrição ao uso de plataformas de hospedagem como o Airbnb.
Proibição de locações para hospedagem
O artigo 1.336 do PL estabelece os deveres do condômino e, em seu §1º, veda expressamente o uso das unidades autônomas — apartamentos em condomínios residenciais — para hospedagens atípicas, seja por meio de plataformas digitais, como o Airbnb, seja por qualquer outra forma, salvo autorização expressa na convenção condominial ou deliberação em assembleia.
Na prática, o projeto inverte o entendimento atual: enquanto hoje só se admite a proibição se prevista na convenção, com a reforma, o uso para hospedagem de curta duração passa a ser proibido por padrão — só podendo ocorrer com autorização expressa.
Esse tema é objeto de debates em diversas cidades ao redor do mundo, como Barcelona, Nova York, Berlim e Santa Mônica (EUA), que já adotaram regulamentações rígidas ou, até mesmo, a proibição desse tipo de aluguel. As razões incluem desde a proteção da indústria hoteleira até preocupações com segurança e o impacto inflacionário no mercado imobiliário.
Apesar das controvérsias, é importante considerar que a locação por temporada pode representar uma forma legítima de investimento, ampliando o exercício do direito de propriedade e tornando o turismo mais acessível diante da alta oferta de hospedagens alternativas.
Sanções para condôminos antissociais
Outro ponto de destaque do projeto são as medidas previstas contra condôminos com comportamentos antissociais. O artigo 1.337, §§1º a 6º, define esse tipo de conduta como aquela que gera conflitos recorrentes com os demais moradores — como barulhos excessivos ou atitudes que comprometam a segurança coletiva.
O PL permite a aplicação de multas e, em casos mais graves, a exclusão do condômino, desde que haja deliberação em assembleia com aprovação de dois terços dos presentes e posterior decisão judicial que impeça o acesso do infrator à unidade e às áreas comuns.
Atualmente, o Código Civil prevê apenas a possibilidade de multa para comportamentos reiteradamente antissociais, sem mencionar a exclusão. No entanto, a jurisprudência já reconhece essa possibilidade, como demonstra o Enunciado nº 508 da V Jornada de Direito Civil, que admite a medida em situações excepcionais.
A proposta, ao estabelecer um procedimento legal claro, pode transformar a dinâmica interna dos condomínios, conferindo-lhes instrumentos mais eficazes de gestão. Por outro lado, suscita debates sobre eventuais conflitos com o direito de propriedade e o potencial aumento de disputas judiciais.
Conclusão
O Projeto de Lei 4/2025 busca ampliar a capacidade de autorregulação dos condomínios, aproximando o texto legal da realidade já reconhecida pelos tribunais. No entanto, ao reforçar o poder de entes privados sobre direitos fundamentais — como o de propriedade —, é preciso cautela para evitar abusos e garantir a proporcionalidade nas decisões. A convenção condominial já possui, hoje, papel central na definição das normas internas. O risco, agora, é que uma legislação demasiadamente genérica acabe por legitimar restrições que deveriam ser analisadas caso a caso, conforme a realidade de cada condomínio.
Advogada do escritório Lecir Luz e Wilson Sahade Advogados, com atuação em direito tributário, empresarial, imobiliário e administrativo*
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