
Por Joaquim Pedro de Medeiros Rodrigues* — O Poder Judiciário brasileiro vem ocupando um lugar constrangedor ao retratar a sub-representação das mulheres na magistratura. Mesmo após movimentos institucionais relevantes — em especial do Conselho Nacional de Justiça, órgão de controle administrativo do Judiciário —, observa-se que, à medida que a carreira dos juízes avança, o número de mulheres nas cortes de segunda instância e nos tribunais superiores diminui drasticamente.
Essa distorção não é culpa exclusiva do STF. O modelo de indicação e nomeação de um membro do Supremo acaba por estimular o machismo da sociedade brasileira, haja vista a necessidade de conformação política, especialmente entre o Poderes Executivo e o Legislativo, durante o processo de escolha de quem vai ocupar o novo posto. As disputas que antecedem a escolha de um ministro do STF são, quase sempre, conduzidas por homens: atualmente, e na maior parte do período republicano, os chefes do Executivo e das duas casas do Congresso Nacional são homens; entre os partidos políticos, apenas dois daqueles 18 com representação no Legislativo federal são presididos por mulheres.
Por essa razão, há uma responsabilidade coletiva — da sociedade civil e das instituições — de garantir que a próxima vaga seja preenchida por uma mulher. De fato, é necessária uma responsabilidade institucional, a ser convocada pelo próprio Supremo Tribunal Federal, pela Ordem dos Advogados do Brasil e pelo Congresso Nacional, para que o Poder Executivo e o Senado Federal cumpram o dever de corrigir essa grave distorção na representatividade das mulheres na Suprema Corte.
Aliás, no âmbito dos Poderes, e, inclusive, na sociedade civil, cada vez mais surgem políticas de inclusão e paridade, como as normas do CNJ, regras de seleção pública e medidas voltadas ao estímulo para contratação de mulheres, com o objetivo de equidade para igualar as condições de acesso e ingresso aos cargos e profissões.
Em quase 135 anos de história republicana, o STF contou com apenas três mulheres como ministras, um número absurdamente vergonhoso para a luta das mulheres por respeito, igualdade e inclusão. Um país que pretende enfrentar essa grave desigualdade não pode se sentir confortável com os dados que vêm do próprio Supremo.
Assim, é possível afirmar que o STF se encontra, atualmente, em um verdadeiro estado inconstitucional, em flagrante e grave desrespeito à igualdade tão fortemente propalada pela Constituição da República. O conceito inicial, de "estado de coisas inconstitucional" ocorre quando há uma violação estrutural e generalizada de direitos — justamente como ocorre quando se tem como mira a equidade entre os gêneros. O Poder Judiciário está em um estado permanente de inconstitucionalidade.
Aliás, a nomeação da primeira ministra do Supremo, Ellen Gracie, no fim do ano 2000, expôs a constrangedora constatação do machismo institucional no Judiciário, que não tinha sequer banheiro feminino próximo ao plenário do Tribunal.
Não se está aqui a personalizar erros, mas de reconhecer que há um machismo institucionalizado no Poder Judiciário e que é materializado justamente no âmbito de sua cúpula, isto é, no próprio Supremo Tribunal Federal. Se não houver mobilização social e, principalmente, institucional, a próxima indicação irá refletir a política brasileira, perpetuando o grave estado inconstitucional em que se acha atualmente.
Quando se diz sobre a responsabilidade institucional, é justamente chamando as lideranças e até mesmo os aspirantes ao posto, para que não abandonem a política para a escolha, mas que compreendam que este é o momento de escolher uma ministra. Em palavras diretas: apoiem a aspiração de juristas mulheres.
Portanto, é o momento em que as candidaturas femininas sejam acolhidas pelas lideranças, especialmente aquelas diretamente envolvidas — como a advocacia, a magistratura, os congressistas e o presidente da República. Assim, a distorção poderá ser reduzida e minimizados, aos poucos, os impactos da desigualdade entre homens e mulheres na magistratura.
Advogado. Mestre em direito constitucional pelo IDP*
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