
Por Marcello Terto e Silva* — Nesta semana, participei, na Universidade Sapienza de Roma, do Seminário Internacional Direito Digital: Entre a Inovação e a Regulação, no painel "Advocacia, Inclusão Digital e Inteligência Artificial". O encontro reuniu especialistas de diversos países para discutir os impactos da tecnologia no sistema de Justiça, tendo o Brasil como um dos casos centrais do debate.
Nosso país possui hoje um dos Judiciários mais informatizados do mundo. Paradoxalmente, a sobrecarga de processos continua crescendo. Em 2022, eram cerca de 85 milhões de ações em tramitação. Três anos depois, apesar de mais de 44 milhões de sentenças proferidas em um único ano, o acervo foi reduzido para aproximadamente 80 milhões, mas o número de processos ativos subiu de 60 milhões para 67,35 milhões em apenas 12 meses.
Esse aparente avanço se explica, em grande medida, pela política de racionalização das execuções fiscais, muitas delas suspensas em razão de sua reconhecida ineficiência. Ou seja, nem toda redução estatística representa, de fato, uma melhoria estrutural do sistema.
O dado é claro: decidir mais não significa decidir melhor — nem reduzir a litigiosidade.
Os palestrantes foram unânimes ao apontar os riscos de uma cultura institucional centrada exclusivamente na ideia de "produtividade". Esse modelo estimula decisões em massa, mas não enfrenta as causas profundas da judicialização excessiva. Além disso, cria barreiras indiretas ao acesso à Justiça, penalizando sobretudo os mais vulneráveis e ampliando desigualdades sociais e econômicas historicamente existentes.
A inclusão digital foi outro eixo central do debate. Como ressaltaram os conselheiros federais da OAB Alex Sarkis e Tácia Nunes, não basta informatizar o processo se milhões de brasileiros não dispõem de acesso adequado à internet, equipamentos ou capacitação. Sem políticas públicas inclusivas, o próprio processo judicial corre o risco de se tornar excludente. Daí a relevância da política dos pontos de inclusão digital, estruturada em diferentes níveis pela Resolução CNJ nº 508/2023.
Também se discutiu o papel da inteligência artificial no Judiciário. Como bem observou o Conselheiro Rodrigo Badaró, ela pode ser uma aliada importante, desde que submetida a critérios rigorosos de transparência, controle humano e participação social, em consonância com as diretrizes estabelecidas pela Resolução CNJ nº 615/2025, que disciplina o desenvolvimento e o uso de sistemas de inteligência artificial no âmbito do Poder Judiciário. Caso contrário, corre-se o risco de reproduzir, em escala e velocidade algorítmicas, as mesmas injustiças.
E, como advertiu a desembargadora federal Kátia Balbino, justiça tardia é injustiça; e injustiça rápida não é justiça.
A experiência em Roma reforçou uma convicção essencial: a tecnologia só fará sentido no sistema de Justiça se estiver a serviço da ampliação de direitos, da redução das desigualdades sociais e econômicas e do fortalecimento da confiança da sociedade — e não da mera automação de distorções.
Conselheiro do CNJ*
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