Música

Sinônimo de heavy metal: despedida de Black Sabbath emociona o mundo

Black Sabbath faz show de despedida com formação original em Birmingham e público do mundo inteiro celebra o legado de uma das maiores bandas da história do rock

Black Sabbath -  (crédito: Kleber Sales)
Black Sabbath - (crédito: Kleber Sales)

O mundo se despede de uma das maiores e mais importantes bandas de todos os tempos. O Black Sabbath faz o último show antes do fim do grupo que alterou o curso da música pop ao apresentar o heavy metal para o mundo. Hoje, Ozzy Osbourne, Tony Iommi, Geezer Butler e Bill Ward reeditam a formação original do grupo e sobem ao palco juntos uma última vez em uma celebração do rock no Villa Park, estádio do time de futebol Aston Villa, em Birmingham no Reino Unido em show intitulado Back to beginning.

O show teve os ingressos esgotados há meses, mas uma banda do tamanho e importância do Black Sabbath lota mais do que os, aproximadamente, 42 mil lugares do estádio inglês. Dessa forma, uma transmissão está disponível para venda no site www.backtothebeginning.com em duas opções distintas: uma que dá acesso ao show on-line e que custa R$ 82,25, e outra também dá uma camiseta exclusiva a R$ 274,99. O show começará a ser transmitido às 11h (horário de Brasília) e ficará disponível por 48 horas para todos que comprarem.

Como para além de um show é uma homenagem ao Black Sabbath, o evento ganhou contornos de festival de música. Entre as atrações estão Metallica, Slayer, Pantera, Gojira, Halestorm, Alice In Chains, Lamb Of God, Anthrax e Mastodon. O próprio Ozzy Osbourne também tem um show solo anunciado na lineup.

Outros nomes farão supergrupo que se apresentará durante o dia de evento, são eles: Billy Corgan (The Smashing Pumpkins), David Draiman (Disturbed), Duff McKagan & Slash (Guns 'n Roses), Frank Bello (Anthrax), Fred Durst (Limp Bizkit), Jake E Lee, Jonathan Davis (Korn), KK Downing, Lzzy Hale (Halestorm), Mike Bordin (Faith No More), Rudy Sarzo, Sammy Hagar, Scott Ian (Anthrax), Sleep Token ii (Sleep Token), Papa V Perpetua (Ghost), Tom Morello (Rage Against The Machine), Wolfgang Van Halen e Zakk Wylde.

Todo lucro com o show será revertido para algumas caridades britânicas: Cure Parkinson's, Birmingham Children's Hospital e Acorn Children's Hospice, a um centro de tratamentos paliativos apoiado pelo time de futebol Aston Villa.

Sacrifício de um sonho

Entre as dezenas de milhares de fãs que vão lotar o emocionante show do Sabbath, está o brasiliense Raphael Lima, 28. O jovem fã da banda fez loucuras e estará no chamado Golden Circle, local mais perto do palco para assistir o último show das lendas do rock. O pentester, termo usado para programadores que agem como hackers éticos que testam a penetrabilidade sistemas de segurança on-line, vendeu a moto e foi ainda em maio para a Inglaterra em busca do sonho de se despedir da banda favorita.

Ao Correio, Raphael conta que foi tudo muito rápido. Em uma conversa com uma amiga descobriu o evento e imediatamente anunciou a venda da motocicleta, do modelo Dragstar 650. Após conseguir um comprador, adquiriu as passagens e comprou o ingresso. Ao todo, ele gastou R$ 4.500 de passagens, mais R$ 11 mil no ingresso. "Sim, 11 mil para ficar colado na grade vendo uns senhores de quase 80 anos fazerem história. E vai valer cada centavo!", exalta. "O resto do dinheiro da moto está evaporando elegantemente em hospedagem, cerveja, umas camisetas de banda que eu jurei que não ia comprar e, claro, turismo", brinca.

Raphael tinha feito a promessa de que não perderia mais uma chance de ver o Sabbath após não conseguir ir à turnê que fizeram em 2016 e que teve parada no Brasil. "Cumpri essa promessa. Vim, de coração aberto, disposto a viver esse momento como ele merece ser vivido", conta o fã que menciona que essa não é a primeira vez que a banda anuncia um último show, mas que está disposto a aproveitar cada minuto caso seja mesmo um ponto final. "Se for de fato a despedida, que seja à altura da lenda que eles construíram. Mas mesmo que o Sabbath silencie nos palcos, a verdade é que o que eles escreveram na história da música já é eterno. O fim da banda não apagará o começo de tudo o que ela inspirou", reflete.

Introduzido ao heavy metal graças a coleção de LPs do tio, Raphael encontrou o amor pelo Black Sabbath graças a uma cópia do Paranoid (1970) perdida entre títulos de nomes como Mutantes, Rita Lee, Secos & Molhados e Led Zeppelin. "Daquele momento em diante, tudo mudou: aprendi as letras, passamos a garimpar LPs, e devorei cada música como quem encontra um novo mundo. O Sabbath não foi só uma descoberta — foi um despertar", lembra. Por isso, esse show também é um encontro da criança que ainda habita nele com a banda favorita. "No fim das contas, vendi uma Dragstar e comprei uma história pra contar pro resto da vida. Troquei dois pneus por um riff de War pigs ao vivo", afirma.

  • Black Sabbath
    Black Sabbath Kleber Sales
  • Raphael Lima (esquerda), morador do Cruzeiro em Brasília,  ao lado dos amigos Michelle e Valter na Inglaterra
    Raphael Lima (esquerda), morador do Cruzeiro em Brasília, ao lado dos amigos Michelle e Valter na Inglaterra Arquivo Pessoal
  • Sabbath bloody sabbath (1973)
    Sabbath bloody sabbath (1973) Reprodução
  • Sabotage (1975)
    Sabotage (1975) Reprodução
  • Black Sabbath volume 4 (1972)
    Black Sabbath volume 4 (1972) Reprodução
  • Black Sabbath (1970)
    Black Sabbath (1970) Fotos: Reprodução
  • Paranoid (1970)
    Paranoid (1970) Reprodução

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Escritores da história

O Black Sabbath é tão importante para a história da música quanto é para a trajetória de fãs como Raphael. A banda é considerada a criadora do gênero heavy metal pela forma como tocavam o rock pesado. Um dos motivos principais é a guitarra de Tony Iommi, o músico teve um acidente quando trabalhava em uma fábrica e teve parte de dois dedos decepados. Por esse motivo, ele usa próteses e o instrumento dele é afinado com menos tensão nas cordas, o que faz dos sons do grupo muito destoantes dos que estavam sendo lançados na época.

"O Black Sabbath não é só uma banda, é a fundação de um império sonoro. Eles não criaram apenas o Heavy Metal; eles deram forma a um sentimento, a um grito sombrio que ecoou por gerações inteiras", acredita Raphael. Realmente, a banda foi uma das pioneiras a tratar de ocultismo em letras e sempre se apresentava de forma muito visceral no palco, vide a história de Ozzy Osbourne. Pouco depois de sair da banda, em 1982, ele chegou a decapitar um morcego com a boca em um show nos Estados Unidos.

O retorno dos integrantes originais da banda também é um regresso a origem do gênero, a formação composta por Ozzy, Iommi, Butler e Ward gravou oito álbuns juntos entre 1968 e 1979 e alguns dos melhores entre os 19 que formam a discografia do conjunto. Segundo portal especializado em venda de discos Discogs, essa foi a única formação que gravou mais de um álbum de estúdio pelo Black Sabbath sem sofrer alteração dos integrantes principais. Ozzy e Ward lidam atualmente com problemas de saúde e colocar todos no palco para um adeus é especial tanto para os fãs quanto para a banda.

Porém, o que resta no final é um extenso legado e uma história marcante que serão celebrados durante o dia de hoje presencialmente em Birmingham, mas nos corações dos fãs no mundo inteiro. "O fim do Black Sabbath deixa uma lacuna enorme, é verdade. Mas também deixa um legado impossível de apagar. Cada banda que sobe num palco com guitarras distorcidas e alma carregada de atitude, carrega um pedaço do Sabbath", destaca Raphael. "O mundo talvez nunca mais veja algo igual. Mas enquanto houver um jovem descobrindo Iron man pela primeira vez, ou alguém tremendo ao ouvir Children of the grave a todo volume, o Sabbath seguirá vivo. Não se trata de uma despedida, é o início da eternidade", completa.

 


Destaques da discografia

O Correio analisa alguns dos principais títulos do Black Sabbath com foco nos trabalhos lançados e produzidos com a formação original da banda.

Black Sabbath (1970) - Disco de estreia

Embora gravado em apenas dois dias e com baixo orçamento, o impacto foi imenso, mas a repercussão, mínima. O impacto foi porque, até aquele momento, ninguém tinha escutado nada igual. Era uma sonoridade inédita, com uma temática igualmente inédita. Definiu os parâmetros daquilo que se passou a chamar de heavy metal (cuja expressão usada pelo escritor beatnick William Burroughs em seus livros é, na verdade, "heavy metal kid"). A vida toda, e com os mais variados cantores, nas várias (e menos charmosas) versões do Sabbath, a banda tocava duas faixas do trabalho de estreia: a homônima Black sabbath e N.I.B..

Paranoid (1970)

Consolidou Sabbath como banda de primeira grandeza, embora a crítica amasse odiá-la na época. Começaram a prestar atenção na guitarra única de Tony Iommi (seus riffs e seus solos especiais por causa das mutilações de dois dedos da mão direita, o que faz com que utilize próteses nas pontas de cada um), na voz de timbre incomum de Ozzy Osbourne, no baixo virtuoso (e nas letras sobre ocultismo) de Geezer Butler e na bateria de Bill Ward, que ia muito além do acompanhamento. Do LP saíram clássicos absolutos: Paranoid (feita apenas para preencher o tempo de um dos lados do vinil), War pigs, Iron man, Fairies wear boots e a acústica (e surpreendente) Planet caravan.

Black Sabbath volume 4 (1972)

Gravado nos Estados Unidos, pode-se considerar o disco mais maduro do Sabbath. Apesar do excesso de drogas (tem até um trocadilho sobre isso nos créditos do LP), o trabalho mostra que os quatro eram músicos muito melhores do que a crítica pensava serem. Canções elaboradas, como Wheels of confusion, Snowblind ou Saint Vitus dance atestam isso e, de certa forma, rompem com os riffs sombrios dos discos anteriores. Mas essa ligação com o passado próximo se percebe em Under the sun, faixa com um riff de guitarra monstruoso e espetacular. Uma forma sensacional de encerrar o trabalho.

Sabbath bloody sabbath (1973)

O choque começa na capa, com a ilustração de Drew Struzan de um homem sendo acossado por demônios. O LP abre com a faixa homônima e, mais uma vez, o Sabbath dá um salto de qualidade — com a ajuda de Spock Wall (ou melhor, Rick Wakeman, tecladista do grupo de rock progressivo Yes), o quarteto incorpora naipe de cordas, Tony Iommi se arrisca na flauta e percebe-se tintas muito mais elaboradas do que mero enfileiramento de riffs de guitarra. Killing yourself to live levantou os milhares de espectadores do California Jam, que lotou o já extinto Ontario Motor Speedway, em 1974. Também era número certo no programa Rock Concert, do empresário da música Don Kirchner.

Sabotage (1975)

O trabalho começa com Hole in the sky, em que Ozzy Osbourne mostra que era um excelente cantor de rock. Segue com Sympton of the universe, na qual Bill Ward rouba a cena de um riff espetacular de Tony Iommi. Mas o disco não é apenas isso — e é aí que fica interessante. Tem novamente naipe de cordas e, até mesmo, um coral de vozes fantasmagóricas — novamente coisa de Rick Wakeman. O nome do disco refere-se à virtual falência do quarteto, espoliado por um um empresário desonesto. Foi a forma de quatro músicos brilhantes se vingarem, sem sequer citarem o nome do indigitado responsável pelas contas zeradas da banda. E legar mais um estupendo trabalho.

postado em 05/07/2025 04:56
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