
Apesar de fazer projeções otimistas para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em 2026, o que ajuda a inflar as receitas, o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2026 foi enviado ao Congresso Nacional, em abril, com um buraco de
R$ 118 bilhões, por conta de recursos incertos para que as contas fechem no azul. Desde então, o governo tenta medidas que aumentem a receita para tapar totalmente esse buraco.
Analistas ouvidos pelo Correio criticam a falta de ajuste fiscal pelo lado do gasto e criticam o excesso de medidas pelo lado da receita, como o recente aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e alertam para o encolhimento abrupto das despesas discricionárias, que podem ser cortadas, no Orçamento a partir de 2027, que coloca em xeque o arcabouço fiscal.
Mesmo incluindo essas receitas fictícias, o PLDO de 2026 previa um resultado primário negativo nas contas do governo central - que inclui Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central - em R$ 16,9 bilhões, o equivalente a 0,12% do Produto Interno Bruto (PIB), mas com a permissão do Supremo Tribunal Federal (STF) para abetar R$ 55,1 bilhões em despesas com o pagamento de precatórios — dívidas judiciais que não cabe mais recurso —, o resultado fica positivo em R$ 38,2 bilhões, nas projeções da proposta orçamentária.
E, com isso, o governo segue sem medidas importantes de ajuste fiscal pelo lado da despesas. Na semana passada, em audiência na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, sinalizou o interesse do governo em reduzir em 10%, de forma linear, a conta total subsídios, que somou
R$ 678,4 bilhões em 2024, ou 5,78% do PIB patamar acima da meta de 2% do PIB em até 2029.
Em 2021, quando a regra foi aprovada, apenas as despesas com renúncias tributárias eram estimadas em R$ 307,9 bilhões, e, em 2026, o PLDO prevê que essa fatura passe para R$ 620 bilhões — aumento de 101,7% em apenas cinco anos, na contramão do princípio da proposta. E nem mesmo o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que tinha um ministro da Economia considerado ortodoxo (Paulo Guedes), atacou essas despesas. Pelo contrário, ajudou a aumentar.
Em 2021, o gasto tributário cresceu para 5,25% do PIB, e saltou para 6,10% em 2022, último ano da gestão, que culminou com as chamadas pedaladas dos precatórios — dívidas judiciais que não cabe recurso.
A proposta de corte linear de 10% sinalizada por Tebet, contudo, é vista com ceticismo por analistas, porque o engessamento dos subsídios é elevado. Desse montante, 52,7% desses gastos tributários não podem ser mexidos porque estão protegidos por emenda constitucional, somando R$ 298 bilhões - o equivalente a 2,5% do PIB. Entre eles, estão incentivos fiscais polêmicos, como o Simples Nacional e a Zona Franca de Manaus (ZFM), que estão entre as maiores despesas com gastos tributários.
Desafio do IR
Enquanto isso, a prometida agenda de revisão dos gastos de forma geral tem ficado de lado. Nos bastidores, o consenso é que não houve espaço para a implementação, que não tem apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da base governista. Analistas lembram que uma das principais promessas de campanha de Lula, a isenção do Imposto de Renda (IR) para os trabalhadores com renda mensal de até R$ 5 mil, que está em tramitação no Congresso, ainda precisa de medidas compensatórias para o aumento de despesas obrigatórias em torno de R$ 35 bilhões a R$ 50 bilhões por ano.
Estimativas de analistas sobre os impactos da Medida Provisória 1303/2025, que tem como objetivo gerar as receitas necessárias para tapar esse novo buraco pode ser menores, não chegando R$ 20 bilhões, a exemplo do que ocorreu com as projeções de receita com a volta do voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), que foram superestimadas.
O ex-secretário do Tesouro Nacional Jeferson Bittencourt, líder de Macroeconomia do Banco Asa, aponta que, no Orçamento de 2024, havia cerca de R$ 55 bilhões de arrecadação prevista com o Carf e, no fim do ano, o governo arrecadou R$ 300 milhões. "Havia uma projeção de receita com o Carf de R$ 28 bilhões, e, em maio, passou para zero. Com isso, o mercado já não compra muito o anúncio do Orçamento, porque até a votação em dezembro, se ela ocorrer, ainda existe muita coisa que pode ser incluída na tramitação", explica.
Apesar de reconhecer como legítima a necessidade de o governo aumentar os gastos na assistência social e no combate à desigualdade, como o prometido em campanha, o economista Benito Salomão, professor da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), reconhece que o forte aumento dos gastos tributários revelam a dificuldade de qualquer governo lidar com a pauta fiscal.
"Existem grupos influentes que são beneficiados por subsídios que oferecem resistência ao ajuste fiscal por essa rubrica. E o fato é que o governo não deve atacar essas questões, especialmente porque a pauta arrecadatória tem ajudado o governo a evitar essa questão", afirma.
Salomão destaca que o governo vem tendo uma forte ajuda dos ciclos econômicos, porque a atividade tem apresentando desempenho acima das estimativas do mercado desde a pandemia da covid-19. Para ele, na campanha política de 2026, será inevitável que os candidatos reconheçam o problema fiscal que exigirá controle de gastos a partir de 2027, sob o risco de cometerem um "estelionato eleitoral".