
O crescimento de 217% nos casamentos homoafetivos no Distrito Federal nos últimos cinco anos — saltando de 151 registros, em 2020, para 480, em 2024 — vai muito além da estatística. É um gesto coletivo de afirmação, pertencimento e esperança. Em tempos ainda marcados por intolerância, cada certidão emitida carrega a força simbólica de um país que, aos poucos, reconhece que o amor entre pessoas do mesmo sexo não precisa mais se esconder — pode ocupar, pode existir, pode florescer à luz do dia.
Celebrar esses avanços não é ingênuo. É reconhecer que há conquistas concretas sendo vividas, e que essas vitórias são fruto de décadas de luta, de perdas irreparáveis e de coragem ininterrupta da comunidade LGBTQIAPN . Cada união formalizada é, também, uma expressão de cidadania: o cartório, lugar historicamente frio, torna-se espaço de validação do afeto.
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Mas o avanço não se limita aos casamentos. Mais de 500 pessoas trans e não binárias realizaram alterações de nome e gênero nos registros civis desde 2020 no DF. Essa possibilidade, respaldada por decisões do STF, devolve às pessoas trans algo fundamental: o direito de se reconhecerem nos próprios documentos. É um passo decisivo para a dignidade, o acesso ao trabalho, à educação, à saúde e ao simples direito de existir sem constrangimentos.
Essas transformações também movimentam a economia. O crescimento do chamado "pink money" — o poder de consumo da comunidade LGBTQIAPN — se manifesta em eventos de casamento, turismo, moda, cultura e serviços. Cerimônias homoafetivas propiciam renda para fotógrafos, buffets, músicos, cerimonialistas e decoradores, além de promoverem novos formatos de celebração mais inclusivos. A indústria de casamentos se adapta e se amplia quando o amor deixa de ter gênero.
É claro que o avanço econômico não elimina a urgência das pautas sociais. A LGBTfobia continua presente em lares, escolas, templos e aplicativos. A violência especialmente contra pessoas trans e negras, ainda ceifa vidas. O preconceito, muitas vezes disfarçado de opinião ou dogma, impede afetos de florescerem plenamente. E, apesar dos avanços institucionais, boa parte da população ainda vê o casamento entre pessoas do mesmo sexo com reserva.
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Por isso, é preciso manter viva a chama da resistência. O amor conquistado nas leis precisa se converter em respeito nos espaços públicos e privados. Amar sem medo não pode ser privilégio de poucos. O reconhecimento civil é parte da jornada, mas a verdadeira vitória será alcançada quando amar deixar de ser um ato de coragem e passar a ser, simplesmente, um gesto cotidiano.
Iluminar o prédio do STF com as cores da bandeira LGBTQIAPN é bonito, mas é apenas o reflexo simbólico de algo mais profundo: o desejo de que as instituições e a sociedade caminhem juntas em direção à equidade.