
Esses dias, enquanto rolava o feed de alguma rede social qualquer e permanecia alheio ao mundo fora daquela tela, me peguei quase apaixonado por um vídeo da Luana Piovani. Sim, a atriz que já protagonizou tantas polêmicas e memes no meio virtual tinha milhares de curtidas em uma brevíssima fala sobre "não se deixar ser maltratada". A declaração alugou um triplex na minha cabeça — especialmente porque eu me deixava ser maltratado.
Era algo que eu esperava ouvir dela, mas foi dito de forma tão explícita e crua que me desarmou. Enquanto o vídeo se repetia em looping, resolvi dar uma olhada nos comentários, queria saber de onde aquilo tinha saído. Entre algumas declarações machistas e outros xingamentos aleatórios, descobri que se tratava de um trecho do programa Fantástico, ainda da semana passada. Luana participou de um quadro chamado Posso perguntar?, em que respondia a perguntas feitas por um grupo de pessoas do espectro autista.
Como quase sempre acontece, o corte da fala da atriz fazia parte de um contexto mais amplo. Luana falava sobre ter deixado o filho de 12 anos ir morar com o pai, em outro país. Segundo o relato dela, o primogênito teria demonstrado um comportamento reprovável e a maltratado. "Eu dava as ordens e ele não respeitava, ele me peitava, e eu vi que ele estava fazendo isso porque queria vir pro Brasil. E eu não me deixo ser maltratada por ninguém: namorado, patrão, pai, mãe, irmão, nem filho", detalhou.
Isso me surpreendeu. A confiança de alguém capaz de identificar — e impedir — um tipo de tratamento negativo ainda me parece uma utopia. Eu me deixo maltratar por estranhos, imagina por pessoas próximas.
Quantas vezes já disse "sim" querendo dizer "não"? Quantas vezes segurei respostas por receio de parecer "abusado"? Quantos momentos simplesmente aceitei calado? A declaração de Luana sacudiu memórias de tantas situações de subserviência.
E ela está certa. Independentemente de qualquer coisa, não podemos nos deixar ser maltratados. Não se trata de uma postura intempestiva, nem de ser agressivo. Trata-se de impor um limite.
Mas por que é tão difícil impedir que sejamos maltratados? Fiquei pensando. Acho que existem muitos motivos. Para este que vos escreve, tem muito a ver com a forma como o mundo me enxerga: gosto de agradar — sempre gostei. E, além de agradar, gosto de ser querido. Em algum momento, na balança dos sentimentos da vida, ser uma pessoa boa e resignada pesou mais do que impor limites aos maus-tratos. Vou além: tenho profundo analfabetismo emocional sobre como interromper esse ciclo. Será que um simples "para, por favor" é suficiente? Talvez.
Independentemente das razões pelas quais aceitamos ser maltratados, ou das formas de lidar com esses limites, o alerta de Luana Piovani é muito válido, é uma lição. O maltrato existe no mundo, de diversas formas — até mesmo contra nós mesmos. Reconhecer isso já é o primeiro passo para evitá-lo.
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