
Reconhecido como um avanço nas relações de trabalho, o emprego orientado pela CLT está sob pressão. Profissionais mais novos têm perdido o interesse pelo modelo, como mostra reportagem do Correio deste domingo. Argumentam que expediente fixo, sobrecarga e baixos salários os afastam do modelo tradicional. E optam por abrir o próprio negócio e atuar como freelancer, entre outras alternativas. A chamada geração Z, com idade entre 15 e 30 anos, traz à tona um movimento cujos desdobramentos vão além da seara pessoal. Questões estruturais para o país também podem ser afetadas. E é preciso que os gestores, tanto os públicos quanto os privados, estejam atentos a isso.
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Nesse novo cenário, desfazer mitos e educar para a gestão de carreiras são medidas imprescindíveis. Ser o dono do próprio negócio — como desejam seis de cada 10 integrantes da geração Z, conforme mostra pesquisa da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) — quase sempre é mergulhar em rotinas que ultrapassam as 44 horas semanais estipuladas pela CLT. Não para por aí. A veia empreendedora dos brasileiros é reconhecida, mas a dificuldade em manter as portas abertas, também. Levantamento do Sebrae mostra que 38% das empresas fecham em menos de cinco anos. Entre os microempreendedores individuais, o número é ainda maior: 42%.
A falta de planejamento financeiro integra a lista dos principais motivos para a insalubre taxa de sobrevivência das empresas brasileiras e costuma não fazer parte da grade curricular das escolas frequentadas pela geração Z, de cursos profissionalizantes a graduações. Nesse sentido, faz-se também necessário o fortalecimento da educação de temas ligados ao empreendedorismo entre os mais novos, sobretudo no ensino médio.
Ao Correio, o economista Otto Nogami, professor do Insper, elenca entre as adaptações "urgentes" face ao desinteresse pela CLT a adoção de "políticas públicas voltadas ao ensino técnico, empreendedorismo, habilidades digitais e educação financeira", além da regulação e fiscalização das relações de trabalho. O especialista cogita ainda a antecipação de reformas, considerando que o enfraquecimento do modelo tradicional afeta a sustentabilidade do já combalido sistema previdenciário. "Como a Previdência é sustentada pelas contribuições dos trabalhadores formais, o esvaziamento da base pode acelerar a necessidade de novas reformas", justifica.
Também precisarão fazer ajustes os departamentos de RH de empresas privadas, uma vez que é pertinente antecipar que elas terão um quadro de funcionários mais velhos, incluindo aqueles que executam funções operacionais e as comumente destinadas aos iniciantes. Em um país com dificuldades para lidar com o próprio envelhecimento, esse tipo de mudança na cultura das organizações certamente vai levar tempo. Há de se ressaltar que esse mesmo Brasil resistente à velhice pode ter uma geração de idosos ainda mais desassistida, sem as garantias conquistadas pelo regime previdenciário.
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Não se pode perder de vista que esse desinteresse pela CLT tenha, entre os defensores, interessados em reduzir conquistas trabalhistas. Tal estratégia também não faria bem para o Brasil, que vive, vale lembrar, um momento de alta nos empregos formais. A segurança no trabalho, em todas as suas instâncias, é pilar para o crescimento de qualquer empresa, assim como manter-se alerta às demandas da modernidade. Engavetar a falta de interesse pela CLT, portanto, não é produtivo. O movimento merece um entendimento que concilie sustentabilidade empresarial e bem-estar humano.