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Encontro de Lula e Trump: na mesa, do tarifaço ao combate ao tráfico

Lula e Trump se reúnem neste domingo para discutir sobretaxa a produtos brasileiros. Ofensiva dos EUA na América do Sul também estará entre os assuntos. Ao criticar a investida americana contra a Venezuela, petista diz que traficantes são vítimas dos usuários

Lula se retratou após repercussão de fala:
Lula se retratou após repercussão de fala: "Frase mal colocada" - (crédito: Yasuyoshi Chiba/AFP)

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva chega para a aguardada reunião com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, com uma gama de assuntos a serem colocados na mesa, que vão do tarifaço imposto a produtos brasileiros às retaliações contra autoridades do país, passando pelos ataques que o republicano tem feito à Venezuela e à Colômbia, sob a alegação de combate ao tráfico de drogas. A conversa entre os dois está marcada para o fim da tarde deste domingo, no horário da Malásia, em Kuala Lumpur. No horário de Brasília, ocorre por volta das 7h.

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Lula tem reprovado a ofensiva de Trump na América do Sul e, ao criticar novamente o presidente dos EUA, nesta sexta-feira, o chefe do Executivo disse que traficantes são vítimas dos usuários de drogas. A gafe ocorreu quando ele comentava as ações dos Estados Unidos contra narcotraficantes na costa da Venezuela, o que é visto pelo governo brasileiro com preocupação pela chance de escalar para uma ação militar em território venezuelano.

"Toda vez que a gente fala em combater o tráfico de drogas, provavelmente seria mais fácil a gente combater os nossos viciados internamente. Os usuários são responsáveis pelos traficantes, que são vítimas dos usuários também", disparou. "Você tem gente que vende porque tem gente que compra, e tem gente que compra porque tem gente que vende." Ele acrescentou que é dos países da América do Sul a responsabilidade de combater o crime em seus territórios.

A declaração teve forte repercussão entre opositores nas redes sociais, que acusaram o governo de ser conivente com as organizações criminosas.Horas depois, em postagem nas redes sociais, Lula se retratou e reforçou que é contra o tráfico e o crime organizado, citando ações de seu governo que miram as organizações criminosas, como a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança Pública enviada ao Congresso.

"Fiz uma frase mal colocada nesta quinta e quero dizer que meu posicionamento é muito claro contra os traficantes e o crime organizado", publicou. "Mais importante do que as palavras são as ações que o meu governo vem realizando, como é o caso da maior operação da história contra o crime organizado, o encaminhamento ao Congresso da PEC da Segurança Pública e os recordes na apreensão de drogas no país. Continuaremos firmes no enfrentamento ao tráfico de drogas e ao crime organizado", acrescentou. 

A fala, porém, virou munição para parlamentares da oposição nas redes sociais, que criticam as ações do governo federal no combate às organizações criminosas. "Lula acaba de anunciar que traficantes são vítimas dos usuários. No ritmo que vai, daqui a pouco o PCC vira ONG", escreveu o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG), compartilhando trecho da entrevista coletiva. Já o líder da oposição na Câmara, deputado Zucco (PL-RS), acusou Lula de ser conivente com o tráfico de drogas em sua fala. "Sério, Lula? Passando pano para traficantes? Vergonhoso! Inaceitável!", comentou, em vídeo. 

Também nesta sexta-feira, Lula afirmou que vai tratar com Trump da aplicação de sanções contra autoridades brasileiras. Ele frisou que o objetivo principal do encontro é negociar a relação comercial entre os dois países, convencendo o governo dos EUA de que a balança comercial é superavitária para o lado americano e, portanto, a aplicação de tarifas não se justifica. Porém afirmou que não há "assunto proibido" e que poderá falar sobre outros temas, incluindo as ações militares dos EUA na costa da Venezuela.

"Eu tenho todo interesse em ter essa reunião, tenho toda a disposição de defender os interesses do Brasil e mostrar que houve equívoco nas taxações ao Brasil. E quero provar isso com números. Também quero discutir um pouco a punição que foi dada a ministros brasileiros da Suprema Corte, que não tem nenhuma explicação, nenhum entendimento. Eu acredito muito na negociação", destacou.

Supremo

Entre as sanções impostas pelos Estados Unidos se destaca a aplicação da Lei Magnitsky, criada originalmente para punir terroristas e acusados de violar direitos humanos, contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e a mulher dele. Na prática, a lei impede que os dois façam negócios com quaisquer empresas e bancos americanos, tenham bens nos EUA e até que usem cartões de crédito de bandeiras americanas.

Lula também se mostrou confiante de que a conversa levará a um acordo para suavizar as restrições econômicas e melhorar a relação entre Brasil e Estados Unidos. Sinalizou, porém, que resultados concretos devem aparecer apenas após a conversa. "O acordo certamente não será feito depois de amanhã (hoje), quando eu me reúno com ele. O acordo será feito pelos negociadores, que vão ter de sentar — (Geraldo) Alckmin, Mauro Vieira e (Fernando) Haddad — junto com o pessoal do governo americano, para negociar", declarou. "Eu queria que fosse ontem, mas se for amanhã já está bom. Quanto mais rápido, melhor", emendou, após ser questionado sobre quando o acordo será firmado.

Em 16 de outubro, em Washington, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, apresentou ao seu homólogo, o secretário de Estado Marco Rubio, um pedido para que a sobretaxa de 50% seja suspensa temporariamente enquanto os dois países negociam efetivamente outras soluções. Além disso, o governo brasileiro pleiteia que os setores de café e carne bovina sejam excluídos do tarifaço. 

Na quarta-feira, porém, Trump sinalizou que as tarifas impostas à carne brasileira tiveram um impacto positivo sobre o setor pecuário americano, ao cobrar que os empresários abaixassem o preço interno do produto. A carne subiu 15% do começo do ano até setembro no país, pressionando o republicano para que adote medidas para reduzir os valores. "Os pecuaristas, que eu amo, não entendem que a única razão pela qual eles estão indo tão bem, pela primeira vez em décadas, é porque eu coloquei tarifas no gado que entra nos Estados Unidos, incluindo uma taxa de 50% sobre o Brasil', escreveu Trump em sua plataforma própria, a Truth Social. "Seria bom se eles entendessem isso, mas eles precisam também abaixar seus preços, porque o consumidor é um fator muito grande que eu levo em consideração", acrescentou. O republicano também anunciou um plano na quinta-feira para importar carne da Argentina, a taxas menores, como forma de baratear os preços — o que irritou os pecuaristas.

Cautela

Nos bastidores do governo, há um otimismo cauteloso com a reunião deste domingo. Por um lado, as conversas preparatórias para a reunião foram vistas como positivas, com demonstrações de interesse de autoridades americanas na negociação. Do lado americano, há interesse na exploração de terras raras e na redução de tarifas sobre o metanol dos EUA, feito principalmente de milho. Tais negociações, porém, são delicadas e devem levar tempo até a conclusão — já que envolvem questões de soberania e podem impactar as vendas do etanol brasileiro, feito da cana. Uma oferta mais imediata seria um investimento de US$ 40 bilhões pela Embraer nos Estados Unidos, para a compra de peças de aviação americanas, o que também tende a agradar a gestão Trump. 

Há o temor, inclusive, do impacto das críticas de Lula a Trump durante esta semana. O brasileiro havia abrandado o discurso contra os Estados Unidos desde o breve encontro na Assembleia Geral da Nações Unidas, em setembro. No sábado passado, ao falar a estudantes em São Bernardo do Campo (SP), Lula defendeu a independência da América do Sul para que "nunca mais um presidente de outro país ouse falar grosso com o Brasil, porque a gente não vai aceitar". Já na segunda, em Brasília, citou diretamente o republicano. "Todo mundo sabe que, quando o presidente Trump sobretaxou o Brasil e ofendeu o Brasil, a gente não baixou a cabeça", afirmou. Ele acirrou as críticas após novas intervenções dos EUA contra a Venezuela e a Colômbia, escalando a crise e ameaçando ações militares diretas na região. No mesmo dia, o petista criticou diretamente "intervenções estrangeiras", em um evento do Itamaraty.

Na quinta-feira, já na Indonésia, Lula voltou a criticar a imposição de tarifas unilaterais, sem citar os EUA — mas em referência clara ao tarifaço. Além disso, também reforçou a intenção de que países do Brics façam comércio em moedas locais, sem depender do dólar americano, algo que desagrada fortemente a gestão Trump.

 

 

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postado em 25/10/2025 03:55
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