Ódio, desinformação, influenciadores e propagandas são elementos presentes nas principais redes sociais da atualidade. De acordo com o engenheiro de software e criador do Orkut, Orkut Buyukkökten, faltam a essas plataformas a experiência humana. “A prioridade das empresas que administram as redes sociais não é criar um valor de uso, nem fazer as pessoas mais felizes, mas, sim, lucrar”, expõe.
Em entrevista exclusiva ao Correio, Buyukkökten falou sobre desinformação e ódio nas redes sociais, moderação de conteúdo, além de adiantar algumas informações sobre a rede social que está desenvolvendo, ainda sem data de lançamento prevista. Segundo o engenheiro de software, a plataforma será parecida com o Orkut, pois “será centrada em comunidades”.
Buyukkökten estará em Brasília entre 22 e 24 de novembro para participar do Festival Pixel Show, no Mané Garrincha, que contará com workshop, games, música, Sharp Talks e conferência. Os ingressos podem ser adquiridos por meio do site do festival.
Confira a seguir a entrevista completa com Orkut:
Desinformação e a polarização são questões críticas nas redes sociais atualmente. Como as plataformas podem combater esses problemas sem restringir a liberdade de expressão dos usuários?
Eu acredito que é necessário otimizar de forma correta a tecnologia. Se você olhar para as redes sociais hoje, existe uma quantidade tremenda de dados. Toda a experiência humana está se convertendo em dados, que são usados para construir modelos para cada pessoa, e eles podem prever e manipular o seu comportamento. A prioridade das empresas que administram as redes sociais não é criar um valor de uso, nem fazer as pessoas mais felizes, mas, sim, lucrar.
Para ter cada vez mais lucro, é necessário criar mais engajamento, e o que engaja é a negatividade e a desinformação, conteúdos que atiçam as emoções humanas. Dessa forma, esses algoritmos estão otimizados para divulgar desinformação e ódio, já que esse tipo de conteúdo gera maior engajamento, o que significa mais propaganda e maior lucro. As redes sociais hoje estão programadas para gerar lucro em vez de unir as pessoas e formar comunidades para melhorar a sociedade.
E quem teria que ser responsabilizado pelo ódio nas redes sociais?
Acredito que os líderes que estão no comando delas. Eles precisam garantir que a prioridade seja não só manter as economias da empresa, mas também entregar valor ao usuário. A proposta das redes sociais é criar conexões sociais para ajudar comunidades e unir as pessoas, mas hoje, em vez de nos unir, elas trazem muita negatividade, depressão, questões de saúde mental. Os líderes que estão no comando precisam ter certeza de que estão criando uma experiência que beneficie o usuário e não apenas seus próprios bolsos.
Para você, qual a maior mudança que as redes sociais precisam fazer para se centrar mais nas pessoas do que no lucro?
Construir uma rede social é como construir uma cidade. Em uma cidade, é necessário ter lugares públicos para as pessoas se encontrarem, como parques, museus, cinema, shopping. O jeito como você desenha e interage com a cidade impacta diretamente como as pessoas interagem umas com as outras e como elas interagem com a própria cidade.
As empresas de redes sociais hoje não têm como prioridade garantir que as pessoas tenham uma relação feliz e saudável com a plataforma, mas apenas garantir que elas passem mais tempo nelas, a fim de monetizar o máximo possível.
Hoje, quando eu converso com a geração Z, geração X ou millennials e pergunto qual a última vez em que eles se encontraram cara a cara com alguém que conheceram no Instagram, Facebook, Tik Tok, eles respondem “nunca”. Essas redes são mais sobre marketing, empresas, propagandas e influenciadores. Os influenciadores são um grande problema, porque muitos não transmitem realidade.
Nossos modelos costumavam ser figuras históricas, nossos pais, pessoas da nossa família ou políticos. Hoje, quando olhamos para a nova geração, os modelos que eles seguem são influenciadores que muitas vezes não trazem valor nenhum. O objetivo é conseguir comentários, curtidas e seguidores e não trazer valores para a experiência social.
E você acredita que dá para mudar a mentalidade dessa geração que quer ser influencer?
Sim, precisamos criar plataformas que priorizem a autenticidade, conexões reais e felicidade. Temos que criar plataformas que realmente se preocupem em unir pessoas e criar comunidades. Eu acredito que essa nova geração especialmente gosta muito de experiências autênticas compartilhadas, e os jovens estão procurando um lugar onde possam ser eles mesmos.
Se você olhar as redes sociais hoje, existem apenas realidades falsamente orquestradas, como fotos com facetune. Quando olhamos nossos feeds, passamos muito tempo neles nos comparando constantemente com nossos amigos e pessoas que seguimos e pensamos que não estamos bons o suficiente, nem atraentes o suficiente, nem inteligentes o suficiente. Como resultado, temos agora uma geração extremamente insegura, ansiosa e infeliz, que não sabe como se conectar e nem conversar na vida real.
Com a crescente de conteúdos danosos nas redes sociais, qual a sua opinião sobre a moderação automatizada? É possível encontrar um equilíbrio entre a tecnologia e a moderação realizada por seres humanos?
Existem milhões de conteúdos gerados online, então não é humanamente possível moderar todo esse conteúdo manualmente, mas felizmente temos a tecnologia e ferramentas, além da inteligência artificial. Essas tecnologias ajudam muito no processo de moderação. Mas, no final das contas, quem as programa são humanos. É necessário um equilíbrio saudável entre os moderadores: você tem uma parte tecnológica, que tem os algoritmos e o poder para reportar e remover conteúdo ofensivo; e, no topo deles, há a comunidade.
Se pensar no caso do Orkut, a maior parte da moderação acontecia por meio da comunidade, que ajudava a manter um ambiente saudável participando da moderação do conteúdo. Eu acredito que deva ser um balanço delicado entre algoritmos, usuários e moderadores da própria rede social.
Você está desenvolvendo uma nova plataforma. Quais são os principais pilares desta nova rede e como ela se difere das outras redes dominantes hoje?
Os principais pilares são positividade, conexão e comunidades. Estamos otimizando toda a experiência em comunidades e em unir as pessoas. Em cada decisão tecnológica nós pensamos em unir as pessoas, compartilhar, aproveitar e fomentar comunidades. É um tipo completamente diferente de experiência. Nosso feed é otimizado para promover a conexão em vez de propagandas e conteúdos virais.
E essa rede será similar ao Orkut?
Eu diria que sim, porque o Orkut era centrado nas comunidades, além de ser otimizado para a conexão social. Essa nova plataforma é também sobre conexão, comunidades e positividade.
Tem alguma previsão de quando a plataforma será lançada?
Ainda não anunciamos nada e eu não gosto de fazer promessas que eu não possa cumprir. Então, por enquanto não vamos anunciar nada.
Mais do que nunca, precisamos de um lugar que seja otimizado para a humanidade, que crie felicidade, confiança, autenticidade e momentos únicos e maravilhosos. A vida é sobre isso. Se você olhar para como a tecnologia impactou a humanidade ao longo do tempo, obviamente ela nos aproximou com a invenção do telefone, do smartphone e da internet, mas também nos fez mais materialistas. Nós focamos em nós mesmos em vez de focar na comunidade e na sociedade. Acredito que um jeito de consertar isso também é com a tecnologia, construindo produtos e serviços que sejam otimizados para uma boa experiência do usuário, e não para o lucro.
Estou esperançoso para o futuro, e a nova geração, que é tão cheia de amor, curiosidade e paixão, vão nos ajudar a conquistar essa nova interação nas plataformas.